Aquele dia era mesmo um daqueles dias em que não te apetece mesmo nada, não queres ver amigos, não queres falar, nem sequer respirar...mas ela tentou reagir...assim saiu, apanhou o 28, sentou-se, fones nos ouvidos e mais nada. O eléctrico, para ela, era como uma máquina do tempo, fazia com que podesse esquecer tudo, e com que o tempo parasse.. So que chegou a altura em que a carreira do 28 acabou, assim teve que descer naquela paragem, e despertar de repente...O seu olhar era como o das crianças que vêem a luz pela primeira vez...tirou os fones e começou a ouvir uma música no ar...Pensou que o aparelho estivesse ainda ligado, mas não, estava no off- não pode ser- pensou.. Era uma música triste, mas alegra, ouviam-se também pessoas a cantar..Começou a caminhar, reparou que estava na Graça, conhecia bem aquela zona, mas naquele momento andava como um bêbado à procura da sua casa, à toa...ao mesmo tempo tinha a sua guia, a música, aquele fadinho que saia dum lugar que ainda nao conhecia.
-Não pode ser- pensava- não há lugares que não conheço-. Foi naquele momento que reparou que tinha deixado todas as sua certezas na paragem do 28. As palavras do fado agora estavam mais claras:
"Venho aqui buscar as asas
Dos meus sonhos de menino
Neste chão e nestas casas
Foi crescendo o meu destino...
Dos meus sonhos de menino
Neste chão e nestas casas
Foi crescendo o meu destino...
Uma senhora à porta da tasca leu a dor que a A. sentia, leu a tristeza que acompanhava o andar dela.
-Sente-se- disse de repente. Não era um daqueles empregados que atiram os turistas para dentro dum bar, naquele momento era uma mãe que tentava dar um carinho à filha. E foi mesmo assim. Fez com que a A. sentasse, trouxe uma imperial e uns pastéis de bacalhau e como uma mãe começou a dar mimos à filha que encontrou pela primeira vez, bem crescida e nem sequer portuguesa.. A duração daquela felicidade foi o tempo duns fados vadios, mas agora a alma da A estava entregue àquelas palavras que tocavam no ar:
...Depois, parti p'ra longe, sem saber
Que aqui ficava muito do meu ser
Esta emoção de estar aqui
Pode ser saudade... pode ser saudade
E esta canção que fiz p'ra ti
Pode ser saudade... pode ser saudade
Ver no rosto desta gente
Espelhar-se a minha infância
É como se eu, de repente
Fosse de novo criança
Se alguém quer desprezar sua raíz
É porque se esqueceu que foi feliz"
...Depois, parti p'ra longe, sem saber
Que aqui ficava muito do meu ser
Esta emoção de estar aqui
Pode ser saudade... pode ser saudade
E esta canção que fiz p'ra ti
Pode ser saudade... pode ser saudade
Ver no rosto desta gente
Espelhar-se a minha infância
É como se eu, de repente
Fosse de novo criança
Se alguém quer desprezar sua raíz
É porque se esqueceu que foi feliz"
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